quarta-feira, 2 de julho de 2008

Ideologia de ruptura por excelência...

"Nos anos quarenta, tal como no virar do século, as direitas mantêm-se apenas duas: perante liberais e conservadores erguem-se os revolucionários, os dissidentes, os contestatários. Na verdade, não são mais do que duas realidades históricas representadas por duas categorias analíticas. De um lado, os homens e movimentos que aceitam os princípios de base e as regras do jogo em vigor na democracia liberal - o que implica igualmente uma aceitação de facto da ordem estabelecida - e de outro lado, os que a rejeitam: os revoltados que durante todo o meio século que vai até ao Verão de 1940 prepararam a queda da democracia. (...)

Os movimentos fascistas - todos os movimentos fascistas - participam de uma mesma genealogia: uma revolta contra a democracia liberal e a sociedade burguesa, uma recusa absoluta em aceitar as conclusões inerentes à visão do mundo, à explicação dos fenómenos sociais e de relações humanas de todos os sistemas de pensamento ditos «materialistas». (...)

É assim que emerge da realidade histórica do meio-século que precede a Segunda Guerra Mundial a essência do fascismo: uma síntese de nacionalismo orgânico e de socialismo anti-marxista, uma ideologia revolucionária fundada sobre a recusa ao mesmo tempo do liberalismo, do marxismo e da democracia. Essencialmente, a ideologia fascista é uma recusa do «materialismo» - o liberalismo, o marxismo e a democracia não representam mais do que diferentes facetas do mesmo mal «materialista» - e assume-se como geradora de uma revolução espiritual total. O activismo fascista, aliado ao elitismo, preconiza um poder político forte, livre dos entraves da democracia: emanação da Nação, o Estado representa a sociedade reunindo todas as suas classes. A planificação, o dirigismo económico, o corporativismo constituem elementos maiores do pensamento fascista, que se traduzem mais concretamente na vitória da Política sobre a Economia e na entrega de todas as alavancas de comando da economia e da sociedade nas mãos do Estado.

Ideologia de ruptura por excelência, o fascismo representa a recusa de uma certa cultura política associada à herança do século XVIII e da Revolução Francesa. Propõe lançar as bases de uma nova civilização. Uma civilização comunitária, anti-individualista, única via capaz de assegurar a permanência de uma colectividade humana onde são perfeitamente integrados todos os estratos e classes da sociedade.
O quadro natural dessa colectividade harmónica, orgânica, é a Nação. Uma nação apurada, revitalizada, onde o indivíduo representa uma célula do organismo colectivo; uma nação que goza de uma unidade moral que o liberalismo e o marxismo, ambos factores de deslocação e de guerra, nunca poderiam assegurar. São essas as componentes do «mínimo» fascista: a força do fascismo vem da sua universalidade, do seu carácter de produto de uma crise da civilização."

Z. Sternhell
in "Ni droite ni gauche. L'idéologie fasciste en France", Complexe, 2000.

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