"O meu guia deixou-me na pista aos primeiros raios da aurora. É o ponto de encontro com os guerrilheiros. Dois homens escoltam-me. Avançamos em silêncio. Uma bruma espessa flutua ainda sobre o rio que contornamos. O caminho alarga-se até uma clareira onde se aglutinam algumas cabanas: estamos no Quartel-General do 201 batalhão. Avanço com um passo ligeiramente hesitante. Um oficial aproxima-se de mim. É o Coronel Nerdah Mya. Recebe-me com um sorriso prudente. É filho do General Bo Mya, chefe da revolta contra o poder birmanês, falecido em 2006. Por sua vez, carrega as esperanças de um povo que aspira à sua independência e luta desde 1948 contra o poder do Myanmar. O povo Karen é uma das 38 minorias étnicas da Birmânia. Nem o terror permanente, nem a violência das repressões tiveram efeito neste povo, orgulhoso de um Estado auto-proclamado em 1950, o “País da Felicidade” (“Kawthoolei”). Há mais de meio século que os guerreiros do KNLA (braço armado do movimento de libertação) lutam pela identidade e sobrevivência do povo Karen. Sem grandes meios e mal armada, a rebelião agrupa alguns milhares de “maquisards” disseminados pela zona de fronteira birmano-tailandesa.
O Coronel fala-me dos seus homens, do KNLA, da crise humanitária, de sofrimento e de determinação, desta guerra que parece condenada a permanecer na sombra. Desde há três anos a ofensiva militar birmanesa centra-se sobre as populações civis: fala-se de verdadeiro genocídio. Estima-se que 150 000 karens se acumulem actualmente em campos de refugiados na Tailândia. Oferece-me uma chávena de chá, e autoriza-me a tirar algumas fotografias. Uma patrulha acaba de voltar. Exaustos da guerrilha da selva, os homens batem-se como os seus pais lhes ensinaram, até porque aqui não se torna soldado, nasce-se soldado. Guerreiros de armas enferrujadas, olhares bravos ou indiferentes, cúmplices por vezes, doentes em suspenso, mulheres e crianças de miséria e de esperança, seguem a minha objectiva. Fala-se pouco, os cães vagueiam, o calor torna-se mais opressivo. Impassível sob a sua sombra, um jovem combatente limpa lentamente a sua arma; A guerra, ele conhece-a; não conhece outro lugar para além daquele. Já tem visto passar repórteres. Vêm e vão. De quem é este pedaço de terra ? Ele não pensa mais, sabe simplesmente qual é o preço da liberdade. Um velho companheiro junta-se a ele. As suas veias sulcam o braço como o rio Irraouaddy.
Um homem aproxima-se, devo deixar o campo… Um último olhar para observar um grande momento de emoção.
Longe da atenção internacional, esgotados pelos anos de uma guerra sangrenta, pela sobrevivência de todo um povo, a mais velha guerrilha do planeta continua a existir."
Olivier Sarbil
sexta-feira, 21 de novembro de 2008
Guerreiros Esquecidos
Categorias:
Povo Karen
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